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As mulheres negras no mundo do trabalho e na política

Leia o artigo das dirigentes da Fitmetal Luciana Arcanjo e Raimunda Leone, em celebração ao 25 de Julho – Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra


POR Luciana Arcanjo

Publicado em 25 de julho de 2025

POR Raimunda Leone


Foto de CRESS

Este 25 de julho é uma data de celebração para as trabalhadoras pardas e pretas. Trata-se do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, bem como do Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. Como base para essas comemorações, evocamos, antes de tudo, a resistência feminina à escravidão.

Como sabemos, as mulheres negras não chegaram ao continente de modo espontâneo. Por mais de três séculos, homens e mulheres foram trazidos à força da África, por meio do tráfico transatlântico de escravizados. Estima-se que, apenas no Brasil, desembarcaram cerca de 10 mil de africanos nessas condições.

Este foi o caso de Aqualtune, que, forçada a deixar a África Central num navio negreiro, veio ao País como cativa e se tornou uma das primeiras líderes quilombolas. No século 17, antes mesmo de seu filho Ganga Zumba e de seu neto Zumbi, Aqualtune chefiou um dos maiores mocambos no Quilombo dos Palmares.

Coube aos movimentos antirracistas, em especial, recuperar sua história e consagrar Aqualtune como uma pioneira entre as “guerreiras” ou “heroínas” negras. É fundamental que o sindicalismo também se referencie em seu legado. Afinal, a resistência à escravatura está nas origens da luta de classes em território brasileiro, por incluir a denúncia das condições de trabalho. Por isso, Aqualtune pode ser considerada, simbolicamente, a primeira mulher sindicalista do País.

A exemplo de Aqualtune, Tereza de Benguela é um ícone da luta contra a escravidão. Após a morte de seu marido, José Piolho, a “Rainha Tereza” liderou o Quilombo do Piolho ou (Quilombo do Quariterê), no Mato Grosso, por 20 anos. Quariterê seguiu a sina de Palmares e foi destruída por expedições bandeirantes, a mando dos colonizadores portugueses.

Com a Lei Nº 12.987/2014, sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, o País passou a ter oficialmente este Dia de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, o que contribui para uma releitura crítica da História do Brasil. É preciso combater o mito de que os “desbravadores” bandeirantes são heróis nacionais – e de que indígenas e negros eram indolentes, desobedientes ou insubordinados.

Disparidades atuais

Passados 255 anos da morte da “Rainha Tereza” (1700-1770), as mulheres negras seguem na luta pela plena emancipação, contra o racismo, o patriarcado e o machismo. Essa luta passa, necessariamente, pelo mundo do trabalho, marcado, até hoje, por graves discriminações e desigualdades.

A cartilha elaborada pelo governo Lula para apresentar a Lei de Igualdade Salarial (Lei Nº 14.611/2023) apresenta números que expõem tais disparidades. “No Brasil, de acordo com os dados do IBGE, as mulheres recebem, em média, 20,4% a menos do que os homens, sendo que, entre as mulheres negras a diferença é ainda maior, 39,2%”, afirma o texto.

O governo acrescenta: “Essas desigualdades são frutos de práticas discriminatórias e da divisão sexual do trabalho – que atribui às mulheres o trabalho de reprodução (cuidado com a casa e cuidado com as pessoas dependentes) e desvaloriza o seu papel na atividade econômica remunerada. As mulheres também enfrentam mais dificuldades para ingressar e se manter no mercado de trabalho”.

Segundo o IBGE, as mulheres gastam 13,6% de seu tempo diário com tarefas domésticas e de cuidado, enquanto os homens dedicam apenas 6,3% do tempo a essas atividades. É o chamado “trabalho não remunerado”, que impõe uma sobrecarga feminina, com jornadas duplas ou triplas.

Embora as mulheres representem 51,7% da população em idade de trabalhar, os homens é que respondem por 56,8% das pessoas com emprego no Brasil. No final de 2024, o IBGE mostrava que 69,0% dos brasileiros estavam com ocupação remunerada, contra 49,1% das brasileiras.

A questão racial evidencia mais desigualdades. Entre os trabalhadores desempregados, 63% são pretos ou pardos. Além disso, das pessoas empregadas no trabalho de cuidados – que inclui o doméstico –, 45% são mulheres negras. As taxas de informalidade, subutilização e desalento também são mais desfavoráveis para trabalhadores pretos e pardos.

Sub-representação

Essas contradições afetam a participação das mulheres – e, em especial, das mulheres negras – na política. Mesmo com cotas e outras regras eleitorais que garantam mais candidaturas femininas, a sub-representação persiste, conforme aponta o mapa Mulheres na Política: 2025, da União Interparlamentar e da ONU Mulheres.

“O Brasil segue a tendência dos últimos anos e continua mal posicionado: o País ocupa a 133ª colocação no ranking global de representação parlamentar de mulheres e a 53ª posição no ranking de representação ministerial”, indica o documento. Com somente 93 deputadas federais e 16 senadoras, as mulheres – maioria da população brasileira – não passam de 18,1% da Câmara dos Deputados e de 19,8% do Senado. Em 1º de janeiro de 2025, dez dos 31 ministérios do governo federal eram comandados por mulheres.

Para mudar tamanhas desigualdades estruturais – tanto no mercado de trabalho quanto na política –, o primeiro passo é ter consciência da natureza machista e racista desses fenômenos. O Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e o Dia de Tereza de Benguela e da Mulher Negra são importantes nesse sentido.

Mas o sindicalismo brasileiro, ao lado dos movimentos feministas e antirracistas, pode jogar papel decisivo. Bandeiras gerais de luta – como a redução da jornada de trabalho, o estímulo à formalização e a isonomia (salário igual para trabalho igual) – beneficiam especialmente as mulheres.

Nas negociações coletivas, os sindicatos devem buscar acordos e convenções que incorporem cláusulas voltadas às trabalhadoras. Entre essas pautas, podemos destacar o combate ao assédio moral e sexual, a estabilidade para mulheres gestantes e lactantes, a licença-maternidade e o auxílio-creche.

Já a ampliação da representação feminina na política passa, necessariamente, pelo avanço nas cotas em concursos e cargos públicos. A Lei Nº 9.504/1997 – que obrigou todos os partidos a lançarem ao menos 30% de candidaturas femininas nas eleições proporcionais – não é mais suficiente. Sem uma nova legislação, que reserve um percentual mínimo de vagas para mulheres nos parlamentos, avançaremos pouco nessa batalha. Não queremos ser apenas candidatas. Queremos, acima de tudo, ser eleitas para fazer a diferença.

Que a saga de Aqualtune, Tereza de Benguela e outras heroínas nos inspire ainda mais. A resistência das mulheres negras continua!


Luciana Arcanjo

Secretária da Mulher da Fitmetal e vice-presidenta do Sindicato dos Metalúrgicos de Jaguariúna e Região (SP).


Raimunda Leone

Secretária de Combate ao Racismo da Fitmetal, secretária-adjunta de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da CTB e secretária-geral da CTB-RJ.